Somos maiores que nossas vontades, melhores que nossa percepção de nós mesmos, mais lúcidos que a autocrítica nos deixa perceber. Essa visão otimista sobre a personalidade, embora não me acompanhe a todo momento, é uma missão em si mesma: ser melhor todos os dias.
Eu me disponho a me criticar repetidamente. É verdade que o exercício não traz a felicidade que desejo, pois a perfeição é um alvo impossível. Menos que isso, perceber que não tenho remédio é, talvez, o resultado mais constante e mais desanimador que se alcança. Por que me forço, então, a essa tarefa, eu me pergunto, e outros também o fazem. Por que esperar que os outros sejam assim, a não ser para que compartilhem de uma amargura permanente, como bem reparou um comentarista anônimo do blog?
O autoconhecimento é fundamental para a compreensão das outras pessoas. Na medida em que demarcamos nossos defeitos, em que os depuramos, através da análise das suas origens, da sua permanência e da sua purgação -- definitiva ou pelo enquanto --, é possível garantir, em pequenas doses, que somos, sim, pessoas confiáveis. Que podemos nos doar com relativa certeza de não estarmos enganando os outros, porque não estamos enganando a nós mesmos.
A percepção apurada de quem se permitiu chegar até aqui há de concluir: sou destinado a jamais encontrar uma alma complementar, se é assim que desejo ver a prática alheia. Não é verdade! Todos somos hipócritas, quantas vezes já reconheci! Mesmo eu, mesmo você que me lê, mesmo todas as melhores pessoas que nos servem como referência, todos nós temos as nossas culpas, então é natural enxergá-las, em nós mesmos! E nos outros, igualmente! Como, então, definir "almas complementares", se elas são uma miragem dos nossos desejos?
Um misantropo foge do mundo que não tem percepção de si ou que tenta enganá-lo. Os ignorantes o são, com tanta intensidade, que se imaginam pessoas boas ou que suas mazelas são insignificantes. Os que se escondem atrás de máscaras, deliberadamente, para forçá-lo a acreditar naquilo que vê, praticam um dolo tão repugnante como o mentiroso compulsivo, que faz do que não é real a sua própria vida. Nossa missão seria, tão somente, praticar o autoconhecimento, reprimir a hipocrisia em nós mesmos e, na tentativa de viver a "normalidade", dedicar-nos a encontrar quem se reserva os mesmos ideais, os mesmos ritos. O diálogo entre esses iguais, sobre as coisas boas que há na vida -- e também sobre as ruins, quando é o caso --, tem o poder de fazer de gentes assim pessoas mais felizes, mais "pertencidas" que os que apenas "passam" a vida.
Primeiro passo: iniciar o diálogo!
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